Baldim
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ELEIÇÕES EM BALDIM, SOB UM PRISMA TEATRAL
Aproveitando que estou pensando em retornar ao mundo do teatro como escritor de peças do dia a dia urbano, farei um pequeno ensaio do que um singelo e frágil município do extremo norte da Região Metropolitana de BH passou nos últimos meses. Para ficar mais fácil o entendimento, estou dividindo esta peça em atos. Apesar de todos os meus esforços, não consegui definir qual o gênero teatral em que mais se enquadra o acontecido: talvez seja um drama ou um policial, com momentos de comédia salpicados de humor negro, ou mesmo uma ópera. Mas a retidão dos padrões da moral universal foi ditada pelo povo e o bem prevaleceu ao final. Para o futuro esta narrativa servirá de testemunho para os historiadores. Então, vejamos como seria o roteiro dessa peça:
Afonso Starling, 1º Prefeito de Baldim
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PRÓLOGO: Cenário do interior
Por um longo período, cuja duração perdura por cerca de 63 anos – desde a emancipação política do município em 1949 -, Baldim insistia na alternância impiedosa de duas correntes políticas conservadoras. De um lado, a antiga UDN deu lugar à ARENA dos militares, ao PDS da pós-ditadura militar, PFL da virada do século, culminando no DEMOCRATAS da atualidade. Alguns partidos coadjuvantes participaram do apoio a esse grupo. Do outro lado, formando fileiras de resistência, o antigo PSD do início da vida política de Baldim se transformara no MDB, oposição “moderada” e quase imperceptível ao militares da ditadura de 1964, origem do atual PMDB. De ambas as partes, bons e maus políticos estiveram no comando do executivo, ditando os rumos de Baldim. Não há como esconder que, a cada mandato, mais ranços políticos e pessoais surgiram nos meandros da vida pública baldinense, em que quase todos lutaram em busca de interesses pessoais e de grupos, relegando a população a um segundo plano. Ninguém tinha forças para reagir e fazer surgir uma terceira via que quebrasse a hegemonia das duas forças conservadoras.
SEGUNDO ATO: Guerra
Assim, como o juiz apita o início de uma partida de futebol, o mês de julho começou com os combatentes se estudando para uma ofensiva maior. Armados de santinhos, faixas, foguetes e jingles, os grandes competidores começaram a mostrar as “manguinhas” e partiram para o ataque. A bebida alcoólica era o combustível daquele pessoal. Meia centena de rapazes e moças de um lado, mais outro tanto de pessoas de outro encarnaram os espíritos dos mais ferrenhos guerreiros da história e partiram para os campos de guerra. O 15 com camisas vermelhas e um coração no peito era o mensageiro de que derramariam sangue, mas não iriam temer qualquer adversário. Já o 25, nas cores azul e verde, representando as árvores estilizadas que simbolizam o partido, não deixavam por menos. Os interesses da população foram deixados de lado e apenas interessava humilhar o lado contrário e tomar o campo de guerra ocupado pelos desafetos. Os veículos de som não paravam de circular com intrépidos decibéis que feriam os ouvidos das pessoas de bem. O terror se espalhou entre os moradores do município e a cada grito de guerra proferido pelos grupos, a cada foguete estourado e a cada carro de som que passava eram motivos para que os mais prudentes se afastassem e até preces foram feitas no sentido de aplacar a ira daqueles guerreiros do 15 e do 25.
TERCEIRO ATO: A Batalha Final
Foram dois meses e meio de combates políticos tendo como palco São Vicente, Vila Amanda e Vargem Grande, além dos diversos povoados e comunidades do município. Houve momentos em que se temia pelo pior com a possibilidade de vítimas fatais, pois eram pedradas, garrafadas, foguetes e muita pancadaria. E o povo? Sempre desrespeitado pelas duas turmas, que davam inveja às torcidas Galoucura e Máfia Azul, do Atlético e do Cruzeiro, respectivamente. E o pior, duas mulheres eram as líderes dos grupos, incitando a violência entre eles. O palco estava armado para a batalha final: na Praça Emílio de Vasconcelos, no Centro de Baldim, aconteceria o grande embate, bem às vésperas das eleições. Entrincheirados, o 15 na Pastelaria do Ivan e o 25 no Bar do Toninho, com pouco mais de 10 metros de asfalto separando os “pelotões”, as provocações começaram no início da tarde. O povo previa: “vai acabar com morte”. Depois de muita cerveja e insultos, os vermelhos e brancos se engalfinharam com os azuis e verdes. Novamente, pedradas, garrafadas, foguetes para todos os lados, mastros de bandeiras, socos, rabos de arraia e todo o tipo de baixaria. O comércio da região central fechou as portas, as mães recolheram seus filhos e se resguardaram em suas residências.Meia hora de pancadaria e a Polícia Militar chega ao local, com a viatura descendo pela contramão com a sirene ligada, em uma ação cinematográfica. Policiais surgem armados com escopetas, revólveres e spray de pimenta. Correria para todos os lados. Alguns militantes do 15 e do 25, bastante embriagados enfrentavam a polícia. Resultado: prisões, incluindo a do chefe do executivo baldinense, com direito a algemas, chutes, socos e cassetetadas.
EPÍLOGO: O Julgamento popular
Seguindo a velha máxima de que mineiro gosta de “um dedo de prosa ao pé do ouvido”, o candidato do 13 mostrava que era um representante do povo, assim como os companheiros Lula e Dilma, e às vezes de chinelo de borracha, passou a visitar os eleitores em suas residências. Não tinha foguetório e muito menos Fundo de Quintal em suas andanças, mas tinha a humildade e a serenidade de expor a todos, sem preconceitos e sem vícios políticos, a sua plataforma de governo. E mais: passou a convocar o povo a participar diretamente nas decisões sobre quais seriam os rumos e obras a serem executadas pela Prefeitura de Baldim, caso fosse eleito.
Chegou o dia 7 de outubro. Apesar de o povo temer que ainda houvesse mais violência em confrontos entre os grandes, o pleito eleitoral decorreu com tranquilidade. Em menos de uma hora após o fechamento das urnas, surge o veredito do povo: venceu a humildade e o respeito às pessoas. Estava eleito Zito, o “cavaleiro” andante que leva em sua bagagem a dignidade e responsabilidade de quem sabe o que quer. Havia chegado a hora de o Partido dos Trabalhadores assumir a posição de comando do município de Baldim para os próximos quatro anos. Quebrou-se a hegemonia de mais de seis décadas. (Gilmar Castilho em 10/10/2012)
Zito, Prefeito eleito, na carreata da vitória
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COMENTÁRIOS
Ione Torres 17/10/2012 00:45:00Gilmar Castilho, obrigada por amenizar a narrativa de um fato real, tão lamentável, ocorrido na Praça Central de nossa cidade. O que seria uma página negra na história política da nossa terra, ser transformada em uma página literária, deve-se ao seu talento de contar histórias. Já que estamos aqui pra contar a história da nossa terra e da nossa gente e nem tudo é tão doce como gostaríamos que fosse, este fato não poderia mesmo ser omitido sem comentários. Portanto, esperamos que esta peça, apesar de todo o seu talento de escritor, nunca seja encenada, mas certamente ela servirá de lição para todos que participaram destas cenas lamentáveis. Aos que assistiram a encenação real desta peça, também vão guardar a lembrança destas imagens, uma lição viva do que não é politicamente correto de ser feito.Ione, editora do Blog
Gilmar Castilho, obrigada por amenizar a narrativa de um fato real, tão lamentável, ocorrido na Praça Central de nossa cidade. O que seria uma página negra na história política da nossa terra, ser transformada em uma página literária, deve-se ao seu talento de contar histórias. Já que estamos aqui pra contar a história da nossa terra e da nossa gente e nem tudo é tão doce como gostaríamos que fosse, este fato não poderia mesmo ser omitido sem comentários. Portanto, esperamos que esta peça, apesar de todo o seu talento de escritor, nunca seja encenada, mas certamente ela servirá de lição para todos que participaram destas cenas lamentáveis. Aos que assistiram a encenação real desta peça, também vão guardar a lembrança destas imagens, uma lição viva do que não é politicamente correto de ser feito.Ione, editora do Blog.
ResponderExcluirGilmar simplesmente espetacular!!! Ainda que amenizando bastante a triste realidade proporcionada pelos "militantes gladiadores", na campanha política de 2012, em que a falta de respeito conscientizou aqueles que se sentiram humilhados diante de tanta "palhaçada". O candidato eleito merece aplausos pela aula política ministrada, em que a humildade e o respeito a DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, estiveram sempre presentes. PARABÉNS!!! Ana Bianca Araújo
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